Muitas crianças, em algumas ocasiões, se sentem obrigadas a beijar e abraçar outros adultos quando não estão a fim.
Quando obrigamos nosso filho a beijar ou abraçar outros adultos, não estamos respeitando a vontade dele. Infelizmente nos importamos mais com o que o outro adulto pode pensar de nosso filho ou de nós do que com o que nosso filho sente ou precisa naquele momento.
Mas que mensagem as crianças recebem quando se sentem forçadas a ter um contato físico que não desejam com um adulto?
Existem muitas maneiras educadas de cumprimentar um adulto sem ser com beijo ou abraço, mesmo um parente próximo. Podemos sorrir ou dizer algo agradável, por exemplo. Não precisamos forçar o contato físico, podemos oferecer opções para que a criança aprenda a cumprimentar da forma como se sentir mais à vontade.
Eu tenho um cunhado aqui na Espanha que não gosta de beijar ninguém como forma de cumprimento. Imagino que tenham forçado ele a beijar outras pessoas quando ele era pequeno e agora que ele é grande e pode se defender, decidiu que não vai mais fazer isso. Eu nunca vi ninguém da família pressionando ele com este tema. No entanto, com a Nara é comum a cobrança ou a chantagem: “Como não vai me beijar? Você não gosta de mim?”. “Se não me der um beijo eu vou roubar“. Você já viu algum adulto dizer essas coisas para outro adulto? Ou dizer algo: “Ah, mas se você não me beijar, então não vou te levar para tomar um café“. Por que costumamos tratar as crianças como nunca tratamos um adulto?
As crianças nem sempre querem que um adulto toque seu corpo ou que as beije sem seu consentimento. Os adultos também não! Ser beijado ou abraçado deveria ser uma escolha e não uma obrigação.
“Ah, mas eu quero que meu filho seja educado, ele tem que aprender as normas sociais. Eu quero que ele seja simpático, agradável“. A educação não se mede por beijos dados. Um sorriso ou um olhar pode ser mais agradável que um beijo forçado. Uma demonstração de afeto não pode ser exigida, se nos sentimos compelidos, deixa de ser um gesto de afeto genuíno. Quando aprendemos algo com algum sentimento negativo envolvido, é muito provável que surja daí alguma crença limitante.
A Yvonne Laborda tem um post muito bom no blog dela (este texto está inspirado no post dela) em que ela fala o que a criança pode internalizar, pensar ou acreditar quando nós a obrigamos a beijar ou abraçar outro adulto:
- Não importa o que eu quero, desejo ou sinto.
- O que os outros querem de mim é mais importante.
- Eu devo satisfazer os outros.
- Eu não posso decidir por mim mesmo.
- Eu sou responsável por fazer os outros felizes.
- Eu tenho que mostrar meu carinho do jeito que eles querem.
- Minhas necessidades não importam.
- Eu devo obedecer para ser amada.
- Mamãe se importa mais com o que os outros dizem do que com o que eu quero, sinto ou preciso.
- Os adultos podem me tocar sem o meu consentimento.
- Meu corpo não pertence a mim.
Precisamos defender nossos filhos quando eles não querem receber beijos ou abraços.
Eu sei que é bem desafiador estar diante de outro adulto que tem expectativa de receber um carinho do nosso filho e leva pro lado pessoal a recusa deles em aceitar o toque. Sim, ficamos com a sensação de que algo está errado, lá no fundo gostaríamos que nosso filho aceitasse a situação sem resistência, que mostrasse como é carinhoso e simpático, que exibisse o quanto nós estamos educando ele bem. Não queremos que nos julguem nem que pensem mal dele. E, sem querer, acabamos passando por cima deles. “É tão rapidinho, ninguém morre por receber um beijo, comigo foi assim e tudo bem, né? Afinal, é carinho, não é agressão“. Será mesmo que tudo bem?
Como fazer nessas situações delicadas? Pode parecer difícil no começo, eu percebo que fico com vontade de agradar o adulto (ou não desapontar, que é praticamente a mesma coisa) e reconheço que isso é algo que tenho que trabalhar em mim. Passo a olhar estas situações como oportunidades de assumir meu papel de mãe, de me colocar com maturidade diante da situação e aprender com ela. Podemos explicar ao outro adulto que nosso filho não sente vontade de dar um beijo hoje e que respeitamos sua decisão. Podemos validar o desconforto dos avós, por exemplo, dizendo algo como: “Eu entendo que você pode se sentir mal quando o João não quer te dar beijos, mas não queremos forçá-lo. Talvez em outro momento ele tenha vontade“. Eu às vezes digo: “Você tá querendo muito um beijo? Eu posso te dar um, se quiser!“.
Dar voz às crianças as capacitará quando estiverem sozinhas ou quando se virem em uma situação forçada.
Elas poderão dizer “não quero” e impor limites se antes o seu corpo e suas decisões tiverem sido respeitados.
E se não formos capazes de aceitar ou entender que uma criança não quer nos beijar, temos que reconhecer que isso é um problema nosso. Então vale nos questionarmos para entender porque não aceitamos a recusa da criança. A Yvonne levanta três perguntas:
- O que acontece com nós adultos?
- Com o que nos conectamos quando uma criança se recusa a nos beijar?
- Talvez não tenhamos sido respeitados, nem tivéssemos voz quando crianças e é por isso que hoje dependemos das amostras de amor dos outros?
Faz sentido para você? O que acharam deste artigo? Você consegue defender seu filho nessas situações? Ou se sente bloqueada? Gostaria que ele agisse de outra forma ou aceita a decisão dele sem estranhar ou se incomodar? Você acha que sua reação pode estar relacionada com algo da sua infância? Te obrigavam a dar beijos e abraços em outros adultos?
Fique à vontade para deixar seu comentário e contar sua experiência!
*Este texto é uma tradução de um artigo da Yvonne Laborda, porém com pitacos da autora deste blog, Maíra Soares.
Ilustração: @escarolota
✍️: Maíra Soares (@cantomaternar), Mentora de Mães e Educadora Parental em Criação Consciente
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